Terça-feira, 10 de Setembro de 2013

PARA ALÉM DA BRUMA

  

Para além da bruma

 

  Todos nós Somos Crentes

 

Todos os homens da terra estão conscientes do infinito e da eternidade. A única diferença que existe entre eles é saber até que ponto essa consciência abala cada indivíduo considerado isoladamente. Um acredita num Deus pessoal acima das coisas e dos homens, o outro acredita no seu próprio querer como no seu Deus, uns são humildes, outros revoltam-se, e todos, seja qual for o comportamento individual de cada um - todos são crentes.

Arthur Schnitzler, in 'Espírito e Religião'

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Sexta-feira, 2 de Novembro de 2012

OLHO O ESPELHO

 

 

 

 

Olá caro leitor!

 

Deixo-me ficar quieta e calada. As sombras apertam o meu corpo e mirram-no. Há pouco olhei o espelho e não me conheci! Sim, não há nenhum sentido de relatividade entre o meu cérebro e este  corpo desconhecido. Andei nos últimos tempos distraída de mim. Foi o melhor tempo reconheço. Os meus sonhos estavam sempre primeiro, não querer ver a realidade. Hoje olhei o espelho e verifico que me estou esfumando.

 

Perante a juventude que me rodeia retraio-me para que não pensem que sou ridícula...bem mas depois rio-me e volto a mim por dias ou meses.

 

Gosto de ser um pouco louca, imaginativa e por vezes inocente. Bem depois há que dizer que tenho a outra parte que se encontra sempre alerta e, por vezes, fica remoendo por pequenas coisas que afinal no tempo certo passam a não ter importância. São as nossas fragilidades, vidros partidos que picam o nosso corpo esvaziando a nossa firmeza nos gestos e nas palavras. Não me conhecem, é isso, não me vêm. Verdadeiramente nunca me conheceram. Vou morrer um dia e pouco saberão de mim por mais que eu fale e pensem que sou espontânea. Falo, falo para acreditar que sou tal e qual assim. Puro engano...a outra fica silenciosa e triste na sua agonia.

 

É verdade há o mar para eu sentir que sou grande como ele e existo no meio de tanto esplendor. Trás-me o som que me embala, os seus vestidos brancos de noivas se espraiando e nos passeios os cães passam satisfeitos com os seus donos. É verdade existem as crianças que correm e são tão inocentes quando olham o mar! A sua pele é fina, as suas olhos falam do amor que recebem ou não. O que está para além de tudo que vislumbro e que ocupa os meus pensamentos? Que sejam felizes, que sejam crianças...

 

Acordar e esquecer o espelho, os olhos que me recriminam silenciosamente...Passo a existir novamente, a querer, a ultrapassar a imagem e ficar com o meu interior ainda intacto.

 

Tenho afinal o tempo da experiência, o tempo das lágrimas e também dos sorrisos. Olho para trás e penso: Gosto de mim...seguro a minha figura e ternamente acalento-a para que por mais algum tempo me deixe usá-la. O meu coração alegra-se com a minha ânsia de vida.

 

Quero mais do que tudo viver e deixar viver todos aqueles que me rodeiam e me amam e que sorriem por eu ser assim.

 

Abraço-vos

 

Aida Nuno

 

 

 

 

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Segunda-feira, 17 de Setembro de 2012

O SONHO

                                            

 
 
        Não quero sair daqui. Quero estar quieta olhando sem ver a parede completamente branca à minha frente. Os pensamentos ultrapassam tudo que é visível e palpável. O sonho foi demasiado nítido e simbólico. Estranho como os meus sonhos, a maioria das vezes, simbolizam tantas situações vividas ou ainda por viver.
 
          Um país distante em guerra. Uma viagem turística que se tornou num pesadelo. Passei momentos de horror fugindo por campos áridos e abandonados. Sempre a correr angustiada tentando esconder-me para não morrer também. Antes da minha fuga guardei à pressa alguma comida num saco. Tive medo de passar fome. Fui perdendo pelo caminho tudo o que trazia: a mala por ser demasiado pesada, o necessaire e por fim os sapatos. Restou-me o saco que nunca abandonei. Escondida, rastejando entre tanta erva seca vi homens a matar outros homens e a rirem-se brutalmente de tanta atrocidade. Escondia-me e depois corria. Escondia-me e depois corria. Estava apavorada. Cheguei por fim a um lugar sossegado e bonito onde as pessoas se divertiam em restaurantes e nas ruas iluminadas. Tentei explicar-lhes o que se estava a passar e ninguém me ouvia. Riam e  convidavam-me a sentar ao pé deles e a partilhar o que estava sobre a mesa. Ninguém me entendia…Eu continuei a fugir confusa com tudo o que me estava a suceder. Só pensava que todos eles iam morrer dentro em breve por não acreditarem em mim. Sonho estranho e aflitivo!
        A sensação ao acordar de que tudo tinha sido real, dada a nitidez e o meu envolvimento, faz-me pensar em situações vividas noutro estádio.
        Tenho medo da incompreensão, tenho medo que não me vejam como eu sou. A minha imagem não transmite o real, as minhas palavras não conseguem transmitir o que sinto e o que sou. Quero que acreditem em mim. Sinto-me presa e apetece-me correr, fugir, esquecer a minha guerra e os momentos em que as realidades surgem e não me dão paz. Tenho de sossegar.
        O amor é bom ser vivido mesmo não sendo partilhado…bem o amor não tem uma explicação plausível. Existe e permanece.
        Sou bruxa…tive sempre medo que um dia me dissessem em circunstâncias dramáticas: “não te prometi nada”. Não foi preciso que a infelicidade total chegasse. Os anjos protegeram-me. No entanto, as palavras surgiram e bateram fortemente em mim e magoaram.
        O amor refugia-se e silencia. O tempo vai ser meu amigo. Assim seja!
 
Maria       
       
       
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Segunda-feira, 5 de Dezembro de 2011

A Fé

 Amiga Tininha,

 

        Estas linhas são só dirigidas à tua mãezinha e a ti. Cheguei ao fim do diário, que tão bem compilaste, e não podia deixar de me expressar sobre o que o meu coração sentiu ao lê-lo.

 

        Ao percorrer as páginas deste longo percurso de Fátima a Roma senti dentro de mim um certo êxtase perante uma Senhora crente e ao mesmo tempo com os pés tão bem assentes na terra. Foi a sua descrição tão lúcida perante tantos percalços e tantas bênçãos, sempre acompanhados por uma Fé inabalável, que me prendeu da primeira à última pagina. No final deste intenso diário gostaria de saber mais, muito mais. Como foram os seus últimos anos?

Se se sentiu verdadeiramente abençoada por Deus com todos os sacrifícios que fez dirigidos a todos que tanto amava e também a outros que estavam bem junto ao seu coração por diversos motivos.

 

        Durante a leitura, apeteceu-me, muitas vezes, ter estado com ela, sentar-me à sombra de uma árvore e partilhar as pequenas coisas da vida, nesse ambiente de paz que tantas vezes menciona nas suas descrições.

 

        É curioso a tua mãezinha e eu termos percorrido os mesmos lugares mas em épocas diferentes: Caldas da Rainha, Cadaval, Bombarral, Baleal e depois na sua caminhada Madrid, Barcelona, Monte Carlo, Mónaco, Provence, Nice, Cannes, Ventimigla, Florença, Roma e ainda outros pontos que, neste momento, não me recordo.

 

        Nos seus percursos mais atribulados e dolorosos nunca desanimou e essa Fé que a acompanhava é qualquer coisa de sublime. Nunca a senti profundamente nem em alturas de maior aflição e já tive algumas. Muito gostaria, antes de partir, sentir verdadeiramente essa Fé em Deus. Acredito e duvido, acredito e duvido e constantemente interrogo... mas se interrogo penso e assim sinto que existo para além das minhas pequenas vaidades e defeitos. Já tenho sentido alguns sinais e esforço-me por viver deixando um pequenino rasto, ou seja, não ter vivido só para as coisas artificiais que cada vez mais nos sufocam.

 

        Em sua memória comecei a dormir com a persiana do meu quarto levantada para que se acordar de noite poder ver o céu da minha janela. Estou na expectativa de abrir os olhos, na noite que percorro, e ver uma lua cheia e um céu bem estrelado. Engraçado é que eu, muitas vezes, pensava: em Lisboa, como saio muito pouco à noite, nunca me lembro de ir à janela e olhar o céu antes de ir dormir. Agora dedico este gesto à tua mãezinha.

 

        Depois deste pequeno resumo do meu sentir perante uma caminhada tão bela e tão emotiva gostei também de saber mais sobre ti Tininha...

 

        Onde nasceste, o teu casamento com o meu amigo Toy, ver as fotos, as tuas lindas tranças, recordar a linda mulher que eu conheci e que ainda espelha a mesma beleza mas de maneira diferente, a tua família e muito mais, foram benesses que não esquecerei. Na última parte do livro, as palavras que dirigiste à tua mãezinha, o epílogo e a carta do Fernand, (tanto gostei de o rever!) tocaram o meu coração.

 

        Não quero acabar esta pequena mensagem sem te dizer que muito apreciei as tuas N.B. que nos esclarecem muito bem sobre pessoas, lugares e acontecimentos que são mencionados no diário. Em todo o livro sente-se o teu cuidado e esforço para que ele seja um belíssimo testemunho para os familiares e amigos presentes e para as gerações vindouras.

 

        Vamos acreditar que o espírito da tua mãe te abençoa daquele lugar tão lindo em que ela sempre cheia de Fé quis alcançar oferecendo as suas orações, a sua bondade e ainda a sua peregrinação a todos os que estavam no seu coração. As suas bênçãos tanto a pobres ou ricos que com ela se cruzaram são para nós um exemplo. As suas alegrias e penas recebidas com toda a humildade são igualmente um testemunho de Fé e Esperança e mais ainda de uma simplicidade de alma que me tocou profundamente.

 

        Amiga Tininha que mais te poderei dizer? Talvez que sempre gostei de ti e que o meu percurso de tristezas e alegrias, a minha determinação e vontade foram germinadas com as tuas palavras e acções numa altura em que me sentia tão desamparada. Depois de ler este testemunho que deixas em memória da tua mãezinha mais percebo o teu carácter e a tua maneira de estar na vida.

 

        Desejo que possas viver em companhia do Fernand muitos anos de felicidade. Espero também que de futuro o nosso contacto seja um pouco mais assíduo porque os anos correm depressa demais.

 

        Com muita amizade, abraço-te a ti e ao Fernand,

 

 

                                                                                  Aida
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Sexta-feira, 28 de Outubro de 2011

O Livro

 

  
    Um dia a minha mãe disse-me que tinha feito um poema, depois outro e outro ainda.
 
   O seu entusiasmo era o entusiasmo da descoberta da insuspeita vontade e capacidade para a poesia. E, como tudo na Vida, foi até ao fim, foi contra tudo, contra o cenário mais razoável de poetizar e ficar por aí.
 
   Quis poetizar para comunicar, para dizer que já sabe o que fazer com tudo o que passou, com tudo o que viveu.
 
   A minha mãe viveu. Não é por ser próprio numa ocasião como esta afirmá-lo, mas a minha mãe apesar de tudo e de todos viveu.
-         Viveu apesar de nascer pobre;
-        Viveu apesar de lhe ter sido recusada a educação;
-        Viveu apesar de lhe ter sido negado o convívio com jovens da sua idade
-         Viveu apesar de ter perdido um filho
-        Viveu apesar de tudo que  nunca me disse
-        Viveu apesar de tudo que sonhou para ela, para mim e para todos.
 
  E com toda esta Vida escreveu tantos poemas que teve que fazer um livro.
 
   E porquê um livro? Porque não deixar estes poemas pessoais na gaveta como testemunhos de uma súbita inspiração terapêutica, tal como aquelas aguarelas ou crónicas que pintamos ou escrevemos na secreta esperança que não vamos descobrir aquilo que não queremos descobrir: que não temos jeito, não temos dedicação ou técnica para ir mais longe.
 
   Não, a minha mãe quis mostrar a todos, quis comunicar a todos aquilo que experimentou, as emoções que escreveu… em fim aquilo que viveu na Vida e transformou em poema.
 
   Estou orgulhoso, mas, sobretudo espantado e surpreso. Como é possível a minha mãe ainda poder descobrir vocações… como é possível a minha mãe reinventar-se assim de repente?
 
   Não vou comentar o livro, isso deixo aos seus leitores. Apenas digo que este livro é uma surpresa e um acto de vontade e perseverança que merece ser apreciado, mais ainda, é sobretudo um livro verdadeiro que merece ser lido.
 
Obrigado.
 
PM
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Domingo, 24 de Julho de 2011

Quero acreditar

Minha querida Mãe,


 

 

     Mãe que me guardaste no teu corpo que me desejou. Como me sentia sereno dentro de ti ouvindo o teu riso, as tuas palavras como murmúrios de água cristalina.

     Nasci e me envolveste com um amor carinhoso e autêntico. Sempre achaste que eu era o mais bonito, o melhor mas não o dizias porque tinhas medo que algo me acontecesse.

     Mãe, como me lembro dos teus afagos,  beijos e as carícias no meu cabelo. As tuas palmadas leves, a tua disciplina e também as zangas porque eu não comia. Tudo era ternura, preocupação para eu crescer bem e ser um Homem com letra grande.

     Os teus beijos mãe ficarão para sempre. Com esses beijos acumulei dentro de mim muita ternura para dar. Com eles vivi da melhor maneira e sei que os retribui, um por um.  

     Parti sem retorno mas esse amor que tivemos ficou acumulado no teu coração com alegria, porque me tiveste, porque me abraçaste, porque me cuidaste. Vai com certeza compensar os momentos maus que irás ter na vida, para poderes batalhar neste mundo que não e fácil de viver sem mim.

     Não sabia que partia mas a vida é assim... Alguns dos filhos têm que partir mais cedo, outros têm que continuar mais tempo. Os objectivos são imensos: descobrir a cura para doenças que ainda são incuráveis, abrir as consciências dos homens que governam, que têm poder... O mundo mãe é uma grande interrogação e de geração em geração tudo se transforma. Sei que não te posso consolar com os meus argumentos mas é o que te posso oferecer minha querida.Perdemos a nossa companhia física mas a memória está contigo mãe. Serei sempre o teu filho bem amado.

     Como eu gostaria de ter continuado contigo para lutar por um mundo melhor, pelos direitos iguais, pela amizade e tudo o mais que me ensinaste mas tu, mãe, não desistas, persiste com o que de bom tens em ti. Continua a dar a tua ternura que tão docemente cultivaste em mim. Nada se perdeu porque continuo feliz por teres sido a minha mãe para além do tempo e do que se vislumbra.

     Obrigada por tudo que me deste, pelos sentimentos que abrigas no teu coração. Mantém-te firme, generosa, humana pois só assim me posso rever em ti.

     Até sempre...teu filho,

 

 

N.G.

 

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Sexta-feira, 17 de Junho de 2011

Este é o meu tempo

Mãe,

        

         Li a tua carta várias vezes. De cada vez que a lia os meus sentimentos iam-se modificando...passaram da intolerância à raiva, por mexeres nas minhas feridas, até ao consolo de afinal ter a minha mãe.

         Sou uma jovem também marcada pela minha infância e isso não se esquece facilmente. Afinal não és tu só mãe que assististe e viveste aquilo que não querias. No entanto mesmo recordando e sentindo ainda o passado, que se prolonga até este presente, podes acreditar que nada do que se passou irá influenciar negativamente o meu futuro porque este é o meu tempo e não abdico daquilo a que tenho direito. Afinal tive um pai e uma mãe. Se a vossa vida em comum foi desajustada tinha forçosamente de captar todo esse clima de desunião. Não foi o vosso divórcio que me machucou, hoje já entrou na vulgaridade, foi o encobrimento do meu verdadeiro pai. Não quero nem devo ser juíza mas tu, na vontade de mudares de vida acabaste de suportar tudo aquilo que odiavas sempre na procura do nada. Depois, como tu própria o dizes, soube da minha paternidade em diversas versões que me chocaram. A tua ingenuidade cobriu-te de remorsos. O teu segredo esteve sempre exposto e nunca quiseste perdoar ao paizinho. Foi tudo muito complicado também para mim e francamente não quero entrar por nenhum caminho que me obrigue a fazer juízos de valor.

         O meu pai, aquele que sempre reconhecerei como tal, partiu mas continua no meu coração. Tinha defeitos e qualidades, bem o sei, mas era puro no seu idealismo e transmitiu-me, tal como tu, ensinamentos que guardarei para sempre. O outro, aquele que verdadeiramente te marcou como mulher, é para mim, como um D. Sebastião que se esfumou na guerra colonial, antes do 25 de Abril, esse Abril que hoje poucos lembram e até alguns jovens desconhecem. Ainda bem que tive um pai que viveu esse tempo e mo transmitiu, com as suas verdades e mentiras, mas que eu vou de ano para ano, tentando inquirir e ponderar a realidade do teu tempo. Chegarei algum dia a algum consenso?

         Sinto-me uma jovem bastante elucidada e pergunto-me, muitas vezes, se o seria se tivesse tido uns pais, como to hei-de dizer, mais vulgares ou seja mais equilibrados. O que eu hoje sei e disso me orgulho, foi que ambos à vossa maneira se debruçaram sobre mim e me incutiram os valores que estão acima da política e da ambição de muitos. Quero, agora mais do que nunca, ser imparcial e flexível. Porque não enterrar as partes menos boas do passado?     É verdade mãe, os jovens de hoje, são menos facciosos, mais abertos à verdade, justiça e clareza.

         Desculpa esta mudança de conteúdo mas tinha que desenvolver o meu raciocínio e dizer-te que foste tu, mais do que ninguém, a minha grande mestra.

         Nada tenho para perdoar. Se viveste um mundo conturbado e no teu íntimo sofreste desajustamentos que a vida te ofereceu, quem sou eu para continuar a infligir-te mais sofrimento? Afinal, como tu bem o dizes, foste acompanhando o meu crescimento e, como tu muitas vezes me provavas, Portugal era pequeno e o teu amor muito grande por mim.

         Estou aqui na varanda da nossa casa. O amor da avó pelas rosas nunca morreu assim como um grande amor por ti. Hoje os canteiros são vasos mas as rosas da avó têm a mesma beleza e perfume todos os anos quando rompe a Primavera. Como fiquei feliz ao saber que vais regressar definitivamente!

         Tenho saudades de assistir contigo a um pôr-do-sol daqueles tão vermelhos que se deixam olhar por morrerem tão mansamente. Já me estou a ver partilhando o meu dia a dia contigo e com a avó. Fiz-te sorrir? Vem mãe...com a tua presença constante e tão necessária...

 

Com amor, a tua filha

                                      Rita

        

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Terça-feira, 10 de Maio de 2011

Coragem

 

 

        Conheci uma jovem que perdeu o seu filho num acidente de bicicleta. O que mais me impressionou, quando a vi pela primeira vez, foi a intensidade do seu olhar, o que tinha contido dentro dela. Foi esta a sua carta cheia de sensibilidade perante a Vida que sente e a rodeia:

 
         “...O que é que ainda me faz pulsar? O que é que eu ainda gosto da Vida e na Vida?
Adianto desde já que detesto optimismos exacerbados, pessimismos mórbidos e miudices diabólicas. Detesto também estas pseudo modernices dos psicólogos que insistem em fazer de qualquer gesto automático e o mais trivial possível uma complicação intricada, uma conspiração sem precedentes à naturalidade das reacções humanas. Por isso sem “ismos”, sem “logias”, sem pseudo explicações capazes de baralhar o mais escorreito dos mortais, vou desfiando o rosário das minhas predilecções, dos meus portos de abrigo em horas de tormenta, das mil e uma insignificâncias do dia-a-dia que somadas sustentam mais a nossa saúde mental contra as investidas da amargura do que grandes ideais filosóficos.
         Desde miúda que ando à procura da beleza como um girassol à procura do sol. As cores do planeta avassalam-me no seu esplendor. Fico em estado de êxtase com a acutilância do azul, naqueles esplendorosos dias de Inverno frios e limpos já a adivinhar a Primavera. Os verdes da natureza, os cheiros luxuriantes dos jardins, todos os odores que me lembram entes queridos ou acontecimentos felizes e me comovem até às lágrimas como o cheiro inebriante dos jasmineiros, tomateiros em flor, sopa de feijão verde com segurelha, a canela do bolo da tia, o meu perfume preferido, a terra molhada da chuva de Verão, as rosas de Santa Teresinha, a erva-doce dos bolos do Oeste...
         Adoro observar os círculos concêntricos na superfície da água, o vaivém das águas de uma piscina ou tanque reflectido no branco de uma parede caiada, um lago cheio de peixes a nadar pachorrentos...
         Gosto da chuva. Imensa, miúda, uma feiticeira que torna verdes os montes; gosto das coisas que se costumam fazer quando chove. O mar, o incomparável mar, a recordação do mar quando era miúda em diversas versões. Mais suave, ainda com remansos de Tejo nas ondas, na praia de Paço-de-Arcos; selvagem e furibundo no Lizandro. A memória das noites na tenda dos avós paternos com o canto desse mar embravecido a embalar-me os sonos de criança. Ao longe era quase uma doce canção.
         Gosto de sair e estar em casa. De dançar ou de ficar quieta. De rir e de chorar. De viajar ou atracar por um tempo indefinido. De acção e de descanso. De contemplação e de pragmatismo. De amigos e de solidão. De luxo e frugalidade. Com as doses de tudo isto é que é pior, que ainda me baralho mas... a perfeição não existe!
         Quando penso que vou despedaçar-me em mil bocados, descubro que uma simples descarga de música electrónica me conserta o ritmo, me arranja nervos e tendões e me fortalece a vontade de seguir viagem.
         Devoro livros, filmes, espectáculos diversos mas não gosto de tudo. Sou selectiva mas muito ecléctica. O maior espectáculo a que já assisti é a Vida. Fico no meu canto do café, do supermercado, da rua a observar as gentes. Etnias, cores de pele, anatomia das faces, o modo como se mexem, quem serão. Atribuo-lhes casa, profissão, companheiro ou companheira, mudo-lhes o penteado, acrescento-lhes batom, perfume ou uma roupa mais bonita. Depois volto as atenções para outra qualquer pessoa e recomeço.
         Tudo isto é viciante...Adoro pintura (ou não tivesse a ver com cores!) e gostaria de pintar a maior parte das coisas que vejo, assim à laia de homenagem ao Arquitecto Grandioso mas não tenho esse dom. Invejo todos os grandes pintores...
         Grande parte do meu tempo não quis viver. A Vida, (pensava eu) era (é!) um raio de jogo cruel mas empanturrei-me de tudo quanto a Vida tinha de bom e de mau ao meu alcance e agora agarro-me com a força dos desesperados ao tempo que acho que me é devido. Ganhei o direito sucessório às memórias dos que já partiram. Estão vivos em mim, por mim e este é o meu tempo. O tempo de conciliar os vivos com os mortos. De retirar das experiências passadas o melhor que houver a aproveitar e ser a guardiã de tudo o que não deve ser esquecido. Entretanto, olho para a palma da minha mão com um pasmo bovino. Todas as linhas que contém. Porque será bifurcada a linha de cima? Parece a língua de uma serpente, a da mão esquerda...é mais interessante que a direita e uso-a muito menos...
         Estou pasmada com as mãos como os bebés. Parece que nunca as vi de facto... A criação perfeita! A “Quiromancia” mantém-me acordada ainda um bocado. A Vida surpreende-me sempre! Este meu espírito irrequieto, inconformado e meio atormentado é o principal culpado por me ter viciado na Vida. Qualquer pequeno átomo de coisa nenhuma me prende e me acalenta como uma estranha pilha de longa duração. A própria palma da minha mão me empurra para a batalha de estar viva.”
 
         A coragem da reconciliação com a Vida, o querer da mente de continuar a absorver o que existe é belo e comovente. A liberdade de viver o quotidiano, de continuar a amar tudo o que se viveu e tudo o que se movimenta e nos ensina a prosseguir, é belo, repito. Porque é belo? Porque na nossa Vida, se quisermos, todos os sentimentos podem coabitar. Assim poderemos lembrar, rir, chorar e ter esperança no amanhã.
 
Aida Nuno
 
 
 
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Segunda-feira, 9 de Maio de 2011

Ultrapassagem

Querida filha,

 

Um dia vais, com certeza, achar a vida da tua mãe absurda e, nalguns aspectos, igual a tantas que vais conhecendo com o passar do tempo. Quando fores realmente uma mulher mais madura, auto-suficiente e que eu espero insubmissa à mentira, compreenderás muita coisa que ficará por dizer. Todos temos a nossa verdade.

 

 

Tudo continuará sempre em mudança. Não há paragens, só oportunidades boas ou más e decisões que muitas vezes nos ultrapassam porque não há tempo nem vislumbre de outras oportunidades, percebes? Sei que já se vão abrindo caminhos mas muito vagarosamente. Para ultrapassar preconceitos, mentiras convenientes, em suma, a hipocrisia de uma sociedade que se gosta de mostrar com a sua capa civilizada, temos de a escandalizar. Quando verdadeiramente evoluirmos neste país tacanho o tempo da tua mãe já passou.


Não sei se para ti serei considerada a mãe ausente, egoísta e sem amor real para te oferecer mas, um dia, irás compreender que só quis dar uns passos mais à frente do que era habitual para a minha época.


Se eu me calasse a tua vida iria ser vivida com certeza sem percalços de maior mas isso não seria bom para ti. Nunca irias saber o que deves saber, o meu tempo, os meus anseios, a minha vida enquanto jovem porque quando a minha velhice chegar todas as minhas atitudes deixarão de ter assim tanta importância. Aprendeste, mesmo sofrendo com o impacto de duras realidades e ainda com a minha ausência, mais qualquer coisa sobre os problemas duma época que eu vivi muito conturbada. As limitações a que nos obrigavam por sermos mulheres eram absurdas. Tudo se vai modificando de gerações para gerações e nós vamos ganhando terreno. O teu caminho está aberto, livre, mas não será fácil.

 

 

Agarro-me à esperança do teu discernimento e inteligência. O teu amanhã será diferente e eu creio que vais acreditar na tua mãe e serás condescendente perante a sua ousadia. A tua juventude, o teu tempo serão favoráveis à compreensão de todo um passado que para mim foi doloroso e de sobrevivência.


Os anos da minha ausência foram usados para me conhecer livre de influências que me fizessem acobardar e esquecer a vida. Assim conheci outros caminhos, fiz opções através de outras janelas que abri como e quando quis. Foi um período de vida em que me senti uma pessoa não utilizada. Espero que me compreendas porque já és uma mulherzinha com uma outra visão às realidades do teu tempo. Com a tua idade, eu sonhava demais, porque vivia em espaços muito limitados.

 

Quando me afastei para me encontrar tu vieste comigo, estavas no meu coração e sempre ali ficaste. Quis procurar-me e a vida profissional ajudou-me a uma mudança. Sei que podia ter escolhido, ficado perto de ti e da avó mas a minha ânsia de conhecer outra maneira de viver foi mais forte e a situação económica teve muito peso. Sabes querida, a mãe quis ultrapassar as grades invisíveis que sempre a impediram de ser livre. Passou os seus melhores anos envolvida por imposições. Mas não foi só isso, o que marcou a tua mãe foram as pressões de muitos anos, que sendo opostas, eram similares. Quis encontrar um clima neutro onde me pudesse ouvir e decidir o que a minha alma e o meu corpo queriam. Errei ou fiz bem? Remexi na minha amargura, idealizei ser outra, representei a vida até sentir-me mulher e por fim distinguir o que realmente vale a pena. Fiz bem ou asneira? Não sei...As alternativas não eram muitas e fugi dos lugares, das paredes, das vozes do passado. Não acarinhei todos os teus dias, não velei diariamente por ti mas tentei nesta ausência estar contigo o mais tempo possível.

 

 

Desculpa querida a omissão da verdade das tuas verdadeiras origens e a ausência de um pai que nunca mais procurei porque o meu orgulho assim o exigiu. Fiz mal ou bem de encaminhar a minha vida assim? Mais uma vez te digo que não sei. Hoje muita coisa deixou de ter significado e só tu, minha filha, ficarás para sempre como o meu amor imenso.


Não me sinto bem. Esta minha independência passou a não ter significado. Afinal nada de muito importante me aconteceu porque não era bem a importância de um presente que eu buscava mas sentir-me livre para perceber a diferença. Afundei-me nesta procura de mim própria e afinal agora vejo que neste amor que sinto por ti é que poderei encontrar a verdadeira felicidade.

 

 

Tu existes, nasceste de mim, eu quis-te mesmo sabendo que não iria ser fácil viver olhando um passado que me marcou profundamente e um presente interdito aos meus sonhos. Depois, bem depois quis varrer a minha casa que começava a estar demasiado suja e fechada como a outra que tinha deixado por circunstâncias muito similares. O meu percurso de criança a adulta foi deveras difícil e, por tudo isso, tinha de pensar e agir por mim para perceber a diferença. Como adulta não podia continuar a viver lamentando-me e encobrindo o segredo da tua paternidade.


Ao contar a minha verdade, tudo o que afinal me roía por dentro, constatei que afinal o que me mortificava não era segredo, que o meu sofrimento não tinha valido a pena. Não devo repetir tudo o que já há alguns anos sabes e em diversas versões. Não te deixes invadir por inseguranças e complexos de falta de identidade. Olha para a tua parte luminosa: a  juventude, beleza, instrução e esse coração bondoso que sei que possuis. Serás tudo o que quiseres. Que continues sempre consciente do valor da tua própria vida.

 

Em breve vou voltar. Não ando bem de saúde e vou regressar à minha verdadeira casa.

 

Desejo recomeçar, rever o teu lindo sorriso e, principalmente, abrirmos os nossos corações ao amor que ficará agora, com certeza, mais fortalecido.


Não me deixes muito tempo à espera e perdoa à tua mãe este desafio, esta busca que, por fim, sinto que terminou.


Agora vou descansar. Hoje escrevi para ti tudo o que sei de mim desejando um futuro contigo. Se te despojares de ressentimentos e me quiseres de volta todo o passado valeu a pena.

 

A mãe que te ama

                               Paula

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Sábado, 9 de Abril de 2011

Introdução ao tema

 

 

      A prática da comunicação consciente pode ajudar-nos a ultrapassar tudo que está bem escondido em nós.

     Para vivermos o nosso dia a dia saudavelmente sem dor, raiva ou mesmo segredos, é preciso destruir essa grande barreira que nos oprime e que torna difícil viver em harmonia connosco e com os outros.

     Porque não falarmos também das alegrias que ficaram no silêncio por pudor. Os nossos vícios e virtudes. Tudo afinal se conjuga porque ninguém é perfeito. Um sem fim de histórias que podemos partilhar.

      Este blog é um desafio a todos que desejarem colaborar e inserir nele um conjunto de temas reais ou imaginativos onde se poderá misturar a ficção com a realidade.   

      Quantas e quantas vezes não compilámos na nossa mente palavras que desejaríamos dizer a alguém que amamos ou detestamos? Depois a coragem e o desejo que nos motivou desaparece e recalcamos mais uma vez o nosso sentir.

      Vamos expor o amor em várias vertentes. Contar segredos guardados e muitos outros desvendados pelos nossos antepassados e que poderiam ficar no esquecimento. Mistérios e sinais que nos trazem a fé de que a Vida nunca acaba.

     Sem expor a nossa identidade tantos temas que, quem sabe, poderiam, ao serem mais tarde escritos no papel, ajudar muitas pessoas a superarem os seus traumas, dúvidas e descrenças sociais e políticas. Tudo o que escrevermos vai com certeza ser uma mais valia para o nosso crescimento.

       Este blog é de todos vós. Entrem nele e escrevam. Podem como alternativa mandar o vosso artigo por e-mail que eu o transcreverei.

       Estou muito consciente do valor deste trabalho. Um mundo real dentro do virtual, vivido com mais ou menos dificuldades, com mais ou menos solidão, como mais ou menos filosofia. Somos afinal o verdadeiro livro da Vida.

 

       São cartas, segredos e mistérios...vamos abrir os nossos corações com o que de melhor temos para dar aos que nos acompanham.

 

Aida Nuno

 

publicado por criar e ousar às 17:07
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